Compaixão é fortaleza

“Meu amor, disciplina é liberdade

Compaixão é fortaleza

Ter bondade é ter coragem”

Há tempos – Legião Urbana

Quem faz parte da Comunidade Gente Boa tem o privilégio de ter acesso a histórias reais e emocionantes – e aprender muito com isso. Também temos um grupo no WhatsApp que sempre que posso, me faço presente (porque não adianta eu só ficar respondendo no automático, não é?).

Dia desses me deparei com um relato que não pude deixar de me envolver: era uma simulação de um atendimento pediátrico de uma aluna de Medicina.

Era uma jovem paciente de 13 anos de idade – vamos chamá-la de Ju.

Ju chegou ao consultório de ginecologia de uma Unidade Básica de Saúde com a queixa de não estar desenvolvendo os seios como as colegas da escola.

Diante da angustiante situação, a médica perguntou com quem Ju morava.

Com uma expressão de tristeza no rosto, Ju respondeu que morava com os avós desde que os pais haviam falecido.

“E você não tem notado nenhum broto mamário?” – indagou a médica.

(O broto mamário é um dos primeiros sinais de puberdade no sexo feminino que ocorre entre os 8 e os 13 anos de idade).

A estudante que fez o relato estava realmente aborrecida com a situação pela falta de humanização no atendimento – mesmo que simulado, é algo que acontece frequentemente.

Infelizmente, a realidade é bastante dura nas Unidades Básicas de Saúde: os atendimentos precisam acontecer em um curto espaço de tempo. Mas como bons profissionais de saúde, precisamos aprender a otimizar esse tempo que nos foi dado (tão precioso!) e, também, desenvolver o exercício da comunicação compassiva.

COMO PODEMOS NOS CONECTAR COM O OUTRO MESMO QUE O TEMPO SEJA CURTO?

Ao notar o olhar de tristeza de Ju ao tocar no assunto da família, o que a médica poderia ter feito nas condições apresentadas?

É possível acolher, mesmo com o tempo curto e o objetivo da consulta ter sido por outro motivo.

Veja só:

“Não consigo imaginar o quão difícil é para você lidar com a ausência dos seus pais. Espero que seus avós estejam te oferecendo todo o amor e cuidado que merece… Quanto a isso, existem espaços de atendimento aqui na Unidade que podem te ajudar.”

Ju poderia receber um sorriso, um afago nas mãos.

É preciso ser prudente quanto ao abraçar – cuide para não invadir o espaço do outro (a).

Sendo assim, é possível voltar ao início da conversa para atender a queixa de Ju, o que a levou até o consultório.

“Mas me conta… você percebeu alguma mudança no seu corpo nos últimos tempos?”

Então você poderá colocar seu conhecimento técnico, solicitar exames, o que for necessário para seguir em frente.

Será impossível adentrar com profundidade na questão do luto, mas Ju vai se sentir vista e cuidada.

Parece pouco.

Parece simples.

Mas acredito que sempre é possível fazer diferente.

27 respostas

  1. Dra. Ana Cláudia.
    Como sou grata por sua generosidade em ensinar com carinho e tanta sabedoria, nessa linda profissão que é a medicina humana.
    Não sou da área de saúde. Mas acompanho seu trabalho, e já li seus livros.
    Gratidão por fazer a diferença.😘

    1. Sou professora. Ensino método clínico centrado na pessoa e como é difícil fazê-los compreender a necessidade de acolher o outro por completo. Obrigada pelo seu ativismo. Te ouvir, te ler me faz permanecer firme, semeando a semente da comunicação compassiva em cada um dos meus estudantes.

  2. Aqui sempre se aprende a ser todo dia um pouquinho melhor. Acompanhando e aprendendno. #gratidão 🎯🌻

  3. Trabalho na área da saúde e sou estudante de enfermagem e é possível ver que um sorriso muda totalmente a condução no atendimento, um gesto simples, comecei a ler seu livro e meu olhar começou a mudar, sou grata pelo seu trabalho…

  4. Qto mais te acompanho mais grta fico de existir olhares como este em situações que o simples pode mover montanhas. Um.bjo fraterno.

  5. Qto mais te acompanho mais garta fico de existir olhares como este em situações que o simples pode mover montanhas. Um bjo fraterno.

  6. Dra.Ana Cláudia,
    Atualmente trabalho como cuidadora de idosos.A vida foi me levando até essa profissão. Acompanho seu trabalho nas redes sociai. O que compartilha conosco,tem ajudado muito,tanto para aprender sobre como tentar lidar com o idoso,quanto a olhar mais pra mim.Quando olho para o cliente e algum dia estou mais irritada,logo penso:poderá ser eu amanhã..
    Por isso,admiro seu trabalho é sou grata.
    Deus abençoe!!

  7. Dra Ana Claudia, adorei seu relato. Quanta delicadeza! Sou médica do serviço público e sei como é difícil , muitas vezes , pelo volume de atendimento, perceber o que está por trás das queixas.
    A pressa muitas vezes nos distância das almas aflitas. Obrigada pela sua sensibilidade.

  8. A vida tem sons que pra gente ouvir… É preciso reaprender a se conectar com as suas origens diante da perda e do inconsciente desprezo pela vida do próximo. Poderia aprender um novo instrumento musical, uma nova língua estrangeira, um novo hábito… Preferi rever as minhas escolhas dos últimos 50 anos, e escolhi cuidar de quem está ao meu alcance, afinal só tenho mais 1/3 de vida, logo que seja bem aproveitado. SENTINELA, sempre. Obrigado.

  9. Sua generosidade e amor é imensa! Nos auxilia em momentos tão delicados! Seus artigos, livros me ajudaram e estão me fortalecendo para viver o luto tão recente de meu pai e acompanhar minha mãezinha acamada com Alzheimer avançado!
    Um luto que se arrasta por oito anos!
    Muito obrigada!

  10. Sou enfermeira e acredito que a palavra humanização alinhado com conhecimento é primordial na enfermagem.
    Um atendimento humanizado um olhar diferenciado para cada paciente faz toda a diferença.
    E na época do COVID ver o sofrimento e desespero no olhar do paciente com COVID ter um olhar com empatia e transmitir segurança e esperança fazia toda diferença e muitas vezes a comunicação era através do olhar e em alguns casos o paciente se recuperava e nos agradecia com sorriso em baixo da máscara de oxigênio.
    Gratidão por espalhar tanto conhecimento e amor. 🙏

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