Ninguém sabe com certeza o que vem depois da morte. Algumas pessoas acreditam que a alma vai para um paraíso eterno. Outras acham que voltamos para Terra em um outro corpo, no que é chamado de reencarnação. Tem até gente que acredita que esse é o fim da linha.
Mas para quem fica do lado de cá, bem vivo, a história é diferente. Quando alguém que amamos morre, daí não dá mais para brincar ou abraçar essa pessoa tão especial. Isso dói. Aprender a viver com essa saudade é uma das coisas mais difíceis da vida, e todo mundo passa por isso um dia.
Falar sobre a morte pode parecer estranho, triste ou até assustador. Mas quanto mais entendemos que ela é parte da vida, menos complicado fica lidar com essa dor quando ela aparece.
“Se a criança entende o que é a morte desde cedo, ela sofre menos quando vive isso. Fingir que nada está acontecendo só atrapalha porque, uma hora, ela vai ter que lidar com a perda de alguém que ama e não vai saber como”, afirma Ana Claudia Quintana Arantes. Ela é médica especialista em cuidados paliativos -uma área da medicina que cuida para que pessoas muito doentes tenham um final de vida mais confortável –e autora do livro infantojuvenil “Onde Fica o Céu”
Ela explica que quando uma criança não consegue viver o luto –o nome dessa tristeza que sentimos ao perder alguém– de maneira saudável, isso pode virar um problema depois. Pode ficar mais difícil fazer amizades, prestar atenção na escola ou até entender os próprios sentimentos. Isso pode acompanhar a pessoa por muito tempo.
Às vezes, os adultos acham que estão ajudando ao não falar do assunto. Pensam que as crianças são pequenas demais para entender ou que vão sofrer mais se entenderem o que aconteceu. Mas isso não é verdade. Crianças são curiosas, fazem muitas perguntas e querem saber o que está acontecendo.
Alguns livros ajudam nessas conversas. Um deles é “A Morte É Assim?”, da espanhola Ellen Duthie e argentina Anna Juan Cantavella. Nele, um menino chamado Fazeel pergunta por que as pessoas precisam morrer. O livro explica: quanto mais envelhecemos, mais difícil fica a vida, já que o corpo fica mais frágil. Além disso, nem caberiam todos os seres humanos no planeta se todo mundo vivesse para sempre.
O livro mostra que, mesmo sendo triste, a morte também tem um sentido e muitos fatos curiosos. Por exemplo, você sabia que doar órgãos depois da morte pode salvar a vida de até 8 pessoas? E que a palavra cemitério vem do grego “koimeterion” e significa “lugar para dormir”? As autoras até dão um aviso: falar de morte não mata.
Quintana, a médica, diz que os livros podem ser espaços de conversa. Essa foi uma das razões pela qual ela decidiu escrever “Onde Fica o Céu”. Ela conta que, por cuidar de pessoas velhinhas ou muito doentes, está sempre em contato com os netos ou filhos desses pacientes. E segundo ela, é essencial que as crianças participem desse momento da família de forma natural.
Às vezes, o sentimento de perda vem mesmo antes de a pessoa morrer. Ver os avós, pais, outros parentes ou até mesmo o seu cachorrinho envelhecendo ou adoecendo não é fácil. Eles não conseguem mais brincar como antes, se cansam com facilidade, precisam de ajuda para comer, andar ou se lembrar das coisas.
Alguns pais preferem não levar os filhos para visitar quem está doente, porque uma coisa dessas pode impressionar. Mas o ideal, diz a médica, é explicar o que está acontecendo de forma simples e verdadeira
“As crianças podem fazer companhia, contar histórias ou até ajudar em pequenas tarefas”, diz Quintana.
Mesmo quando alguém vai embora, o amor que sentimos pela pessoa não vai junto. A relação continua, mas muda de jeito.
Esse tipo de vínculo que continua mesmo depois da morte é o que o menino Benito vive no livro “Uma Oferenda para Perro”, da autora americana Judith Valdés B.. Na trama, depois que seu cachorro Perro morre, Benito aprende que para superar a tristeza e manter o amigo por perto é preciso celebrar as memórias do que viveram juntos.
Lembrar das pessoas e dos animais que amamos e que já se foram é tão importante que, em algumas culturas, isso se transforma até em festa. É uma forma de dizer: “você ainda faz parte da nossa história”.
No Brasil, por exemplo, existe o Dia de Finados, quando muitas famílias vão aos cemitérios levar flores, acender velas ou fazer uma oração. Mas outras culturas e religiões têm comemorações e rituais próprios para honrar aqueles que morreram.
Esses rituais são maneiras de mostrar que, mesmo depois da despedida, os mortos continuam vivos dentro de quem ama.
Veja a seguir alguns deles:
Dia dos Mortos (México)
Comemorada em 2 de novembro, a data é uma das tradições mais importantes do México. Segundo a crença popular, é quando os mortos voltam para visitar seus familiares. Para recebê-los com carinho, as famílias montam altares coloridos com fotos dos entes queridos, flores amarelas, velas, objetos pessoais e comidas que a pessoa gostava.
Obon (Japão)
O festival, que ocorre de 13 a 16 de agosto, tem origens budistas e homenageia os espíritos dos ancestrais japoneses. As famílias limpam os túmulos, oferecem comida e acendem lanternas de papel com os nomes dos mortos para guiar os seus espíritos. A celebração costuma ter também festas públicas que contam com apresentações coletivas de dança, além de barracas de comes e bebes e de jogos para crianças.
Antyesti (Índia)
É o nome dos rituais fúnebres tradicionais do hinduísmo, que significam “último sacrifício”. Eles marcam a despedida do corpo físico e ajudam a alma a seguir sua jornada espiritual. Primeiro, o corpo é lavado, perfumado e vestido com roupas tradicionais. Depois, há uma procissão em que familiares e amigos acompanham o corpo até o local da cremação. As cinzas costumam ser lançadas no rio Ganges, considerado sagrado.
Ma’nene (Indonésia)
Na ilha de Sulawesi, na Indonésia, o corpo de quem morreu é embalsamado e mantido em casa por meses ou anos até que a família esteja pronta para o funeral, que inclui sacrifícios de animais, danças e festas. A cada dois anos, os mortos são exumados, vestidos como roupas novas e levados para passear na comunidade em um ritual.
Enterro Celestial (Tibete)
Em regiões montanhosas do Himalaia existe uma tradição em que o corpo da pessoa que morreu é levado até um local sagrado e oferecido a aves de rapina, como os abutres. Para os seguidores do budismo tibetano, esse ritual ajuda a libertar a alma do corpo. O corpo alimenta outro ser vivo, em harmonia com a natureza.
Caixões personalizados (Gana)
Nesse país africano, alguns caixões são esculpidos em formas que representam a profissão, o sonho ou algo marcante na vida da pessoa, como um avião, peixe ou carro. Essa tradição recente se juntou aos funerais que são grandes eventos sociais, com muita música e dança, celebrando a vida da pessoa.
Fonte: Folha de S. Paulo
Uma resposta
Um presente essa matéria! Entender outros costumes e tradições nos abrem para questionar os nossos próprios – serve para nos prepararmos para a certeira finitude e sermos responsáveis pelo preparo das crianças que amamos que com grande probabilidade assistirão a nossa morte – eu já comprei o livro da Dra ACQA…presente do Ben, meu neto menor. 🙏🏼🌷 ps: chegou em casa ontem 🤗